O desenvolvimento tecnológico, a mudança climática, os movimentos demográficos e a globalização são algumas delas. Tudo isso, emoldurado em um contexto de desconfiança global, em especial no que diz respeito aos órgãos públicos e às empresas; embora atinja também outros atores sociais como as organizações da sociedade civil e os meios de imprensa. Essa visão é pontualizada por um Relatório da CEPAL que diz que “A desconfiança dos cidadãos cresce e está levando a uma desconexão entre a sociedade e as instituições públicas colocando, dessa forma, em risco a coesão social e enfraquecendo o contrato social” [1]. É esse o contexto no qual hoje a atividade produtiva desenvolve suas atividades. Dessa forma, adquire-se consciência que a globalização gerou importantes processos de transformação no papel dos atores que agem em busca do desenvolvimento. A empresa é claramente evidenciada como um ator com características especiais e são justamente essas características, que fazem que hoje a empresa esteja em uma posição “especial” para contribuir para chegar a essa visão compartilhada de sustentabilidade global e também local. As empresas têm consciência que são atores sociais com um enorme potencial para causar impacto na qualidade de vida e no bem-estar das pessoas. Dessa forma, o desenvolvimento produtivo e o mundo do trabalho adquirem um olhar singular e, por sua vez, o relacionamento com outros atores por parte da empresa (sociedade, órgãos governamentais, fornecedores, etc.) assume relevância para o sustento da atividade empresarial. Muitas empresas e suas cadeias de fornecimento começaram a se expandir para outros países da região ou do mundo, contribuindo com o desenvolvimento sustentável dos lugares nos quais operam por meio, não somente da geração de trabalho decente e produtivo e pela contribuição com recursos fiscais, mas também pelo desenvolvimento de fornecedores, pela geração de novas oportunidades para a inovação, pela melhora no acesso de bens e serviços para as comunidades, entre outras externalidades positivas próprias da atividade empresarial. Essas contribuições são valiosas para a melhora da qualidade de vida das pessoas, a melhora das sociedades e da democracia, sempre e quando a atividade empresarial for desenvolvida com responsabilidade.[2] Neste mundo globalizado em que vivemos, as empresas - e muitas vezes, sua cadeia de fornecimento - estão cada vez mais presentes em outros países da região ou do mundo, realizando transações e operando sob novas normativas, sejam locais ou mundiais. Neste âmbito, as diretrizes e os instrumentos internacionais em matéria de conduta empresarial responsável colocam o foco em que as empresas desenvolvam uma abordagem preventiva, que permita garantir o respeito às pessoas e ao ambiente. Portanto, compreender o significado do vínculo entre os Direitos Humanos e o negócio empresarial é essencial para a projeção da empresa no século XXI. Olhando para o momento atual, mas também para as próximas décadas, as empresas enfrentam o desafio de se unirem às iniciativas internacionais voluntárias que vinculam as temáticas dos Direitos Humanos com o negócio empresarial. Nessas iniciativas internacionais voluntárias, encontramos principalmente os ODS (Objetivos do Desenvolvimento Sustentável - Agenda 2030), os Princípios Orientadores das Nações Unidas sobre Empresas e Direitos Humanos, o Guia para as Diretrizes da OCDE para Empresas Multinacionais, bem como a Declaração Tripartite de Princípios da OIT sobre Empresas Multinacionais e Política Social (Declaração EMN). Como marco global de desenvolvimento, a Agenda 2030 - Objetivos do Desenvolvimento Sustentável - abrange temas relacionados com todos os direitos humanos, incluindo os direitos econômicos, civis, culturais, políticos e sociais, bem como o direito ao desenvolvimento. [1] https://www.cepal.org/es/comunicados/recuperar-la-confianza-ciudadanos-instituciones-publicas-es-fundamental-retomar-senda [2] INDH. 2012. Empresas y Derechos Humanos. Disponible en https://www.casadelapaz.cl/derechoshumanosyempresas/wp-content/uploads/2018/09/Cuadernillo-Empresas-y-Derechos-Humanos-INDH.pdf. Visitado en noviembre de 2019.
Essa declaração tripartite, adotada em 1977 e atualizada em 2017 para enfrentar as mudanças da globalização, a economia mundial e as formas de produção e trabalho, é o instrumento da OIT que proporciona orientação direta para as empresas em relação à política social e às práticas inclusivas, responsáveis e sustentáveis no ambiente de trabalho. Essa Declaração tem por objetivo fomentar a contribuição positiva que as empresas podem dar para o progresso econômico e social e para a consecução do trabalho decente para todos, e para minimizar e resolver as dificuldades que podem ocorrer durante as operações dessas empresas. Seus princípios estão dirigidos tanto para as empresas multinacionais, os governos dos países de origem e os governos que as abrigam; como para as empresas nacionais, sem fazer distinção por seu tamanho, e para as organizações de empregadores e de trabalhadores, e abrangem os seguintes âmbitos: Essa Declaração ressalta a importância que o Estado de direito, o cumprimento da legislação e o diálogo social assumem, e recorda que todas as partes deveriam respeitar os direitos dos trabalhadores e contribuir para tornar realidade os princípios e os direitos fundamentais no trabalho e coloca em evidência a importância do diálogo e das consultas entre as diferentes partes, com a finalidade de garantir a conduta empresarial inclusiva, sustentável e responsável das empresas. Além disso, a Declaração EMN faz referência expressa aos Princípios Orientadores das Nações Unidas sobre Empresas e Direitos Humanos e aos Guias Diretrizes da OCDE para Empresas Multinacionais, compondo esses três instrumentos um marco internacional comum sobre a Conduta Empresarial Responsável com o apoio da ONU e de outras instâncias de multilateralismo, os quais serão analisados nos próximos parágrafos. Por outro lado, outros instrumentos destacáveis são a Declaração da OIT sobre a justiça social para uma globalização equitativa, aprovada pela Conferência Internacional do Trabalho (CIT) em 2008, as conclusões da CIT em relação a promover empresas sustentáveis (2007) e as conclusões da CIT em relação ao trabalho decente nas cadeias mundiais de fornecimento (2016), a Agenda de Ação de Addis Abeba (2015) sobre o financiamento para o desenvolvimento e o Acordo de Paris (2015) sobre a mudança climática. Os Princípios Orientadores das Nações Unidas sobre Empresas e Direitos Humanos, estruturados em três pilares - Proteger, Respeitar e Reparar, adotados em 2011, afirmam o princípio de responsabilidade por parte das empresas de respeitar os Direitos Humanos, focando principalmente na forma como as empresas devem colocar em prática essa responsabilidade; isto é, por meio da realização da “devida diligência” em relação aos Direitos Humanos que suas operações podem afetar, seja de forma direta, indireta ou por meio de sua cadeia de valor. No âmbito da Organização para a Cooperação e o Desenvolvimento Econômico (OCDE), a Declaração sobre investimentos internacionais e empresas multinacionais, adotada em 1976, possui como parte integrante os Guias Diretrizes da OCDE para Empresas Multinacionais, cuja revisão mais recente foi concluída em maio de 2011. Esses guias contêm as matérias básicas e fundamentais da sustentabilidade empresarial, totalmente alinhadas com os Princípios Orientadores das Nações Unidas sobre Empresas e Direitos Humanos, bem como com a Declaração Tripartite de Princípios da OIT sobre Empresas Multinacionais e Política Social. Como se evidencia, as empresas estão enfrentando novas exigências por parte, não somente dos cidadãos, mas também de outros grupos de interesse como os investidores, que, por meio de suas agências qualificadoras de riscos, atualmente já avaliam como as companhias enfrentam e administram aspectos que tradicionalmente não estavam sobre a mesa, como os que se referem a temas de sustentabilidade e Direitos Humanos. Isso, devido a que sabem que uma empresa que integra de boa forma esses temas em sua gestão, é mais competitiva, sustentável e rentável. Por sua vez, cada setor de atividade deveria avançar não somente na conscientização de suas empresas sobre esses temas, mas também na identificação de seus principais impactos e riscos sobre as pessoas e seu entorno, já que apenas compreendendo quais são os aspectos concretos em cada um dos setores, será possível conseguir progredir para melhorar o desempenho em vários temas que a abordagem de Direitos Humanos convida a administrar de maneira mais responsável. Administrar essas matérias oportuna e corretamente, pode fazer a diferença entre uma empresa sustentável ou não, claro, entendendo que dada sua profundidade, esse é um processo gradual. Com essa motivação, o projeto Conduta Empresarial Responsável na América Latina e no Caribe apresenta este Guia, para apoiar as empresas diante das novas demandas dos mercados, das legislações e, o mais importante, da sociedade. [1] Para mais informação sobre a Declaração EMN visitar: https://www.ilo.org/empent/areas/mne-declaration/lang--es/index.htm